segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Excelsior


E hoje ele partiu para as terras dos Ancestrais no Outro-Mundo.
E hoje muitos são os que choram sua morte, e relembram seu legado.
Já disse antes, o Druidismo é possivelmente a única religião que inclui as Artes no centro da instituição sacerdotal, é no caminho do Bardo que a formação do Druida tem seu início, porque é pela Arte que idéias e ensinamentos são passados de uma geração à outra, e é por isso que acho que Stan Lee merece ser contado entre os Bardos desta era.
E o que o mestre da Casa das Idéias (o apelido da Marvel Comics) ensinou?
Antes dele, todos os heróis da literatura popular tinham raízes no Pimpinela Escarlate da baronesa Orczy – um espadachim aventureiro e anti-revolucionário que se escondia sob a aparência frívola e inofensiva de sir Percy, um nobre inglês ostensivamente ridículo que ninguém, nem mesmo sua esposa, suspeitaria capaz de heroísmos e coisas que tais; claro, vocês reconhecem a fórmula, sujeito tímido X herói destemido, esta é a origem do Zorro, do Sombra, do Superman e do Batman, e este era o padrão até Stan e seus mosqueteiros Jack Kirby e Steve Ditko subverterem o tema.
O Homem-Aranha também, à primeira vista, contrapõe o nerd tímido Peter Parker a seu alter-ego lançador de teias, mas aí, pela primeira vez, a balança pende para o lado humano: onde o Superman é o indivíduo “real” e inventa Clark Kent como um disfarce para andar no mundo humano, Peter é inescapavelmente humano e sujeito a todo tipo de vicissitude (em uma fase clássica, ele alternava combates contra supervilões com doses de antiácidos para uma úlcera gástica de stress!) e ser o Homem-Aranha era mais uma fonte de problemas e dificuldades em sua vida já complicada, e era apenas por pura responsabilidade que ele mantinha sua missão heróica.
A Marvel criou uma legião de fãs conquistados por esses heróis de face humana, quase todos eles desajustados sociais que acabavam encontrando suas famílias verdadeiras uns com os outros, como o Quarteto Fantástico ou os Vingadores, e chegando ao auge com a apologia da diferença manifesta nos X-Men em sua luta por aceitação e respeito.
Heróis de todos os gêneros, raças e nacionalidades, de todas as linhas políticas e orientações sexuais, de todas as faixas etárias, gente-como-a-gente, feitos à imagem e semelhança da Humanidade em cujo nome lutavam, e que, ao se reconhecer neles, podia despertar para seu próprio e insuspeitado heroísmo.
Esse é o legado que Stan deixou.
Esse é o legado expresso no seu lema, “Excelsior”, Latim para a expressão “mais acima”.
Heróis humanos, e que não se alienam de sua humanidade nem usam seus poderes para dela fugir, e que exortam essa mesma humanidade a seguir pelo caminho que eles abriram, porque, como o Surfista Prateado, talvez a criação favorita de Stan e porta-voz de muitas de suas idéias, é esse potencial oculto que eles vêem quando olham para nós.

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