segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Lago, Salmão, Árvore


Partindo do princípio de que os Druidas originais guardaram sua sabedoria codificada nos mitos que a nós chegaram, e tentando lê-los com olhos-de-Druida, cheguei a algumas idéias que quero partilhar aqui.
Todo druidista moderno que se preza conhece a história de Ceridwen e Gwion, de como ele veio a provar a poção de sabedoria que ela destinava a seu filho e se tornou o bardo supremo Taliesin; quando passamos de Gales à Irlanda, vemos na história de Finneces e Fionn um padrão similar, o salmão da sabedoria cobiçado pelo primeiro concedendo seus dons ao segundo, e ficamos de orelha em pé pela virtual identidade de ambas as histórias...e então topamos com a lenda do gigante Einigen, que teve a revelação do Awen mas só conseguiu transmiti-la depois de morto a Menw, que fundou o bardismo galês, e aí vemos que duas versões podem ser mera coincidência, mas três são conspiração deliberada para passar adiante uma mensagem, mas qual?
Nas três histórias, a sabedoria originalmente destinada a um vai ter com outro, e só depois de "um ano e um dia", o prazo tradicional das lendas, e que eu me arriscaria a traduzir como "no devido tempo", é que ela se torna acessível; talvez isso seja uma advertência para não ter pressa de passar adiante uma inspiração recebida, ou fazê-lo sem expectativa de que ela venha a ser compreendida no ato da transmissão, porque "há um tempo para cada coisa".
Outro ponto notável é que nas três histórias a sabedoria é um conteúdo distinto do veículo que a contém, o qual, sem ela, é inútil ou até mesmo nocivo; a poção de Ceridwen envenena o riacho, o salmão torna-se inútil, os postes de sorveira são adorados sem atenção ao que neles foi inscrito, e o "tempo devido" é necessário para destilar e separar a essência da sabedoria, descartando a parte não essencial.
Mas o que me levou mais tempo e meditação para ver é o seguinte: nas três histórias, há um personagem A, que detém a sabedoria e quer transmiti-la (Ceridwen, Einigen, o vidente que falou a Finneces), um personagem B que é (ou seria) o pretendido herdeiro dessa sabedoria (Avagddu, Finneces, o povo de Einigen), e o personagem C, o inesperado (e aparentemente acidental) receptor da mesma (Gwion, Fionn, Menw); quem leu neste blog a série de postagens sobre as Três Almas vai reconhecer A como representando a Alma Celeste, B a Alma Oceânica e C a Alma Telúrica, e notar que, como já vimos, é a Alma Telúrica que está sempre pronta a receber mensagens da Alma Celeste, enquanto a Alma Oceânica está absorta no seu incessante fluxo de pensamentos e deixa passar a oportunidade.
E as três histórias, uma ao lado da outra, apresentam cada uma um símbolo central (caldeirão, salmão, árvores) que, juntos, remetem à fonte de toda a Inspiração, o mítico poço de Segais: um lago (caldeirão) cercado de aveleiras (árvores) onde vive o Salmão da Sabedoria, as avelãs alimentando o Salmão, cuja presença consagra as águas, que fluem em cinco riachos, os cinco sentidos e a Mente onde eles tem seu substrato, e "sábio é aquele que bebe tanto dos riachos quanto da nascente"
E se avançarmos um pouco mais, e aplicarmos o Ogham a este símbolo composto, o que encontramos?

Salmão - EA ("madeira flutuante", uma metáfora poética)
Água - S (além do salgueiro, este fid se refere ao meio líquido)
Aveleiras - C (uma referência direta)

EASC, a palavra formada, tem similaridade fonética com as palavras irlandesas referentes a água, peixe/salmão e, vejam só, à Lua; referência a um estado contemplativo, diferente do pensamento mais analítico de tipo solar, mas também uma imagem: o que acontece se, ao contemplarmos a Lua cheia, a percebermos como um lago de água prateada, um grande caldeirão de prata, um ovo de salmão, uma avelã descascada, o crânio de um gigante ancestral?
Vejam, o que estou propondo com toda essa elucubração é mais que mero malabarismo de idéias, é um possível método para extrair os ensinamentos ocultos nos contos antigos, começando com uma comparação de imagens e temas, a análise destes conteúdos inicialmente revelados, e o uso controlado da imaginação para "mexer o caldeirão" e destilar todo este processo em imagens, sons/palavras e cenas completas, e deixar as gotas que resultarem desta mistura refinada agirem sobre a alma em contemplação. Obviamente não temos como saber se os Druidas que nos passaram os contos usavam esse método com seus alunos, e nem mesmo se os resultados deste trabalho analítico-intuitivo são válidos como ensinamento espiritual, mas quero trabalhar com isso um pouco e convido todos os que me acompanharam neste texto meio confuso a tentarem também: desde que 2018 começa com uma Lua cheia, vamos mergulhar nesse caldeirão?

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